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Eu sou um construtor
que ama a clara simetria dos terraços
e em cada poema procuro construir a flexível identidade
de uma possível habitação
Mas sem a alta coluna do teu corpo
não poderia iniciar esta obra diária
A lâmpada solar do teu rosto ilumina a minha mão incerta
e eu vejo o horizonte da minha respiração
e reúno as pedras de uma casa sempre incompleta
mas sempre aberta às artérias do sol
às veias do vento
Em torno dessa imaginária casa verdadeira
há um jardim de plácidas árvores aromáticas
e corre um ribeiro com seus anéis cintilantes e voluptuosos
Um monte de um azul claro como o dorso de um réptil
dá-nos a fronte de aérea tranquilidade
de sermos tão da terra como uma palmeira ou um plátano
Termos assim a pacífica ciência de habitar
e o azul pertence-nos porque o rspiramos
Poema de António Ramos Rosa in "O teu rosto"- edição Pedra Formosa, Edições, Lda, Março 1994
Simulo uma fábula
para acariciar as folhas
que ainda não brotaram
Simulo um estábulo de odores espessos
para o conforto do fundo do ventre
para me situar entre as raízes e os astros
Como um insecto na palma do gérmen
e numa torre profunda
vou talhar o arco de um sorriso de água
entre duas vespas agudas do verão
Volto a esta página de argila
e à luz destas paredes fulvas
Subo à garganta cálida do tempo
como um abrigo onde pulsa o sol verde
Estou entre a penumbra e as veias das janelas
entre os astros domésticos
e no movimento de uma calma massa de água
o teu corpo impele a pedra frágil
do meu canto entre a fábula e o real
Poema de António Ramos Rosa, do livro "O Teu Rosto", edição Pedra Formosa, Março 1994