Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
O tempo, este nosso tempo, está estranho como este mundo, este nosso mundo;
"Reivindicações" despropositadas e provocadoras, e é o começo de conflitos que ninguém dá importância e que rapidamente se transformam em guerras que ninguém sabe quando acabam
A rua escorre até ao rio e termina aí
Tímida sem um motivo de interesse
Repugnante
Despida de árvores e de casas
Apenas com barracas de paredes de zinco
Onde rasteja a mais miserável das mais miseráveis condições humanas
Semivivos, cuja riqueza são as inúmeras doenças que o corpo esconde.
E os esgotos a céu aberto
Onde as moscas se divertem
A picar cães e gente muito miúda.
A rua tem vergonha e com uma vontade irresitível
De se afogar no ventre do rio mas no último instante desiste
E assim continua até que a vontade e depois o arrependimento
Tome conta do seu espírito e da sua vontade
Talvez a esperança de melhores dias
Gostaria me desses notícias tuas e me contasses os teus dias. Não sei se tens dias ou noites ou fins de tarde ou apenas uma luz permanente, suave e macia onde repousas o teu corpo.
Não sei se há árvores, mar, animais, ou se o teu mundo é apenas teu ou partilhado por outros nomes, ou se és um nome que habita uma estrela que é só tua e tem o teu nome.
Gostava de saber coisas tuas e se ainda andas em viagem.
Um grande Beijo
Saudades
Santa Maria da Feira, 5 de Fevereiro de 2024
Ali vai o passado, mostrando as lembranças dos tempos mansos e serenos, onde não havia pressa de avançar no tempo nem mágoas pelos dias perdidos em bancos de jardim ou no muro do mercado ou na mesa de um café, ponto de encontro e reunião de todos os dias. Ouvíamos música num gira-discos portátil que dançávamos nos bailes improvisados num espaço que estivesse disponível e conhecíamos de cor e salteado: Otis Redding, Carlos Santana, Procol Harum, Janis Joplin, Rolling Stones, Beatles, Led Zeppelin, Jethro Tull, The Who, Melanie Safka, Moody Blues, Yes, Ten Years After, etc... etc... Os primeiros beijos...
Acolá vai o presente e o futuro mais à frente, muito mais à frente, com pose de marialva, cheio der arrogância
como que dizendo em tom desafiador "Apanha-me se puderes, se tiveres pernas e pulmão, porque o tempo é todo meu. Aproveita as brisas frescas do entardecer e os pôr-de-sóis que ainda te restam".
FRANCISCA RIBEIRO (Pormenor)
ATÉ BREVE
O espanto fixou-se nas pálpebras
E a tua alma brilhou e ficou transparente revelando quem nela habita:
Espíritos; Espantos; Sorrisos; Encontros; Fins de tarde outonais; Madrugadas de Coral,
E o teu rosto de olhos verdes e boca de diamantes gravado em pedra rara,
lembrando o Taj Mahal que conheceste e amaste. e onde gostarias de ter voltado.
INQUIETAÇÕES
Vozes inquietas incendeiam bocas de fogo e
resgatam perguntas antigas tantas vezas feitas
que nunca foram respondidas
ou foram omitidas, olvidadas, assassinadas.
As palavras podem ser uma arma,
podem ser poderosas, mas também podem ser frágeis
quando se tornam incómodas e
o seu destino pode ser a fogueira.
ELEIÇÕES MARÇO 2024
É PRECISO ESTAR VIGILANTE PARA NÃO SERMOS SURPREENDIDOS POR DISCURSOS CHEIOS DE BANALIDADES E PRENHE DE PROMESSAS EM QUE CADA FRASE É APENAS UMA ARMADILHA QUE TEM O ISCO DE QUE MUITO GOSTAS, MAS QUE NO FUTURO VAI DAR-TE AMARGOS DE BOCA.
As ruas, as praças, os mercados, as feiras vão ser invadidas por mocinhos e mocinhas que estão disponíveis para todo o tipo de tarefas, que transportam as albardas como se fossem os burros de carga, e carregadinhos de sorrisos distribuem bandeirinhas, sacos, saquinhos, sacolas, esferográficas, lápis, camisolas e tudo o que a imaginação delirante dos gurus da comunicação partidária conseguirem parir. Não teem voz própria. São apenas a voz do dono. Encaram a política como se fosse uma profissão qualquer. O importante é estar no lugar certo na hora certa, pois há sempre um buraquinho disponível e feito à sua medida e à espera de inquilino.
E na falta de foguetes aparecerão os bombos, as cornetas, os gritos, as palavras de ordem, as palavras de desordem, os beijinhos da ordem, os perdigotos, as bitaitadas do costume, o colinho aos meninos para que nunca se esqueçam de pôr a cruzinha no buraco certo quando chegar a idade, algumas bizarrias, dar nomes diferentes à mesma coisa - Lavoura por Agricultura, Agricultura por Lavoura - contorcionistas não de circo mas da política e as palavras que são expulsas da boca são iguais às expulsas por outras bocas, a única diferença reside no sotaque que identifica a origem do pregador.
É uma animação. Uma festa. Devia ser feriado local ou regional para que toda a população pudesse celebrar e cumprimentar o candidato a nosso chefe. Respeitosamente.
Rasgaram as vestes que amontoaram no centro da praça. E incendiaram-nas.
Estão nus, e as cicatrizes do corpo esculpidas a ferro e a fogo no momento do seu nascimento são a memória viva legada pelos seus ancestrais antepassados, como se fossem mapas que assinalam os percursos das suas vidas: hoje, tristes geografias humanas de sonhos desfeitos e que narram, como se fosse um livro de história, os testemunhos dos seus pais, dos seus avós, da sua família, do seu povo. Para que não esqueçam. De outra forma não seria possível: Um nevoeiro espesso e pardo proíbe a passagem da luz do sol impedindo que as pessoas vejam e relatem depois.
Os corpos estão cansados de tanta porrada. Os olhos parados num tempo em que havia esperança e os lugares eram pacíficos e as cicatrizes revelavam montes e vales verdejantes, planícies de searas vivas. Hoje as cicatrizes revelam nos corpos transparentes a alma vazia de nada que já não se emociona com nada, áspera, azeda, indiferente ao nascimento, à morte, à celebração. Estão encurralados dentro das suas próprias casas à espera que do céu caiam sobre as suas cabeças pragas que matam, incendeiam e reduzem a pó corpos, casas, searas, tudo que é vida.
O seu futuro é não ter futuro. Por isso rasgaram as vestes e incendiaram-nas para que a luz das chamas revele ao mundo as cicatrizes das suas vidas.
Albergo o silêncio como se fosse único e precioso.
Não me incomoda o vento quando toca um instrumento de sopro.
Não me perturba a chuva quando canta ao som de uma banda de jazz.
A pauta tem muitos silêncios; permite ouvir a respiração dos instrumentos em repouso, e sentir os corpos dos músicos marcando os compassos, os ritmos, transpirando swing, libertação, improvisação.
Pouca coisa me incomoda, excepto todos aqueles que diariamente se poêm em bicos de pé para aparecerem nas redes sociais exibindo os seus títulos académicos, ou vestirem o papel de comentadores com a capacidade extraordinária de falarem sobre os assuntos mais diversos e complexos, como se fossem verdadeiros hermeneutas.
O importante é aparecer, seja a propósito ou despropósito, não interessa. O que importa é ser visto, e esboçar no momento certo, um sorriso de circunstância cínico quando a máquina do fotógrafo capturar o momento
Há que esconder a todo o custo, a ignorância, a mediocridade, o mau gosto e ser visto "em boas companhias",
de preferência que sejam um bocadinho mais ignorantes, para poder exibir com vaidade a sua superioridade intelectual.
Que Deus nos livre de gente assim. É o meu desejo para o ano de 2024.
Amen
Santa Maria da Feira, 30 de Dezembro de 2023
A
A casa está vazia
Apenas um toco de vela sobre o tampo rugoso de uma mesa com várias camadas de pó e tempo que
são as testemunhas de uma casa que teve vida lá dentro:
Silêncios, amuos, repreensões, discussões
apaziguamentos, cumplicidades, troca de sorrisos,
os dedos que procuram outros dedos
as mãos que se abraçam
e os corpos que respiram...
A casa está em ruínas
Já lhe pesam os verões e os invernos
As primaveras e os outonos.
Mas já não importa
Já teve muita vida
muitas gargalhadas
algumas lágrimas.
A PALAVRA E O RIO
A palavra e o rio
As sombras espreitam as margens e gritam impropérios
O desassossego assume a forma de peixes
E as pérolas veleiros.
Há vida em todo o lado; aqui, lá, acolá
E as pedras invocam palavras antigas para estarem ali;
juntas da vida, do sol, das perplexidades, do espanto.
O rio tem pressa de chegar ao mar
Precisa de descansar
A viagem foi longa e difícil...
As palavras estão exaustas de tanto escárnio e cinismo, mas não têm pressa
Vão resistindo
Mesmo assassinadas resistem e ressuscitam
As palavras sempre foram resistentes.
OS DIAS
As banalidades caminham de braço dado com outras banalidades.
Os dias apodrecem no fim do dia;
e as madrugadas de Ícaro suicidam-se com os primeiros filamentos de sol.
E os dias somam dias;
e a soma dos dias assume outros nomes e
as borboletas
no seu voo desajeitado
querem enganar o seu destino:
Mas os seus corpos são frágeis, não aguentam muito tempo.
As cadeiras estão vazias
Eram ocupadas por gente que já partiu.
Só resto eu no topo da mesa;
As fotografias pousadas nos pratos lembram os lugares que ocuparam.
QUOTIDIANOS
Os dias empoleirados em outros dias;
Diversas luas assumiram diferentes formas;
Os sonhos empoleirados na cabeça escorrem até à boca;
Os passos seguem-se a outros passos a não ser que queiram parar;
O acordar previamente combinado com o despertador;
Caminhar com agilidade para apanhar o autocarro;
A marmita, sempre a mesma, de cor vermerlha, já não suporta mais a comida que é sempre igual;
São horas de fazer o caminho inverso;
E só se vê cabeças empoleiradas em corpos cansados;
O silêncio é absoluto. Ninguém fala com ninguém;
Não há pressa de chegar a casa. A viagem de regresso é apenas o intervalo, espera-os a rotina, a monotomia, o mesmo desespero de sempre.
Até amanhã
Ajoelho-me perante o desconhecido; não é por medo.
É por humildade.
A ÚLTIMA VIAGEM
Quando a estrada acaba
É o fim do caminho
Nada mais existe
Nem becos para calcar novos caminhos
À tua frente uma parede infinita
Intransponível
Espessa
Fria
Negra
Com uma frase desenhada em tubos de neon:
"Aqui termina o teu caminho, a tua viagem. Não há lugar para arrependimentos, pois já não podes voltar atrás.
Põe-te comfortável."
Santa Maria da Feira, 3 de Novembro de 2023
O teu mundo acaba ali
Quando a noite entra pela madrugada adentro e estou só, os pensamentos invadem o coração e tomam conta do corpo inquieto.
A alma fecha-se como um punho cerrado que aperta não sei o quê, e esmaga a vontade, a força e a inteligência.
Forma-se um nó doloroso na garganta .
Perco-me no interior dos teus olhos verdes e nas memórias edificadas ao longo dos anos que escorrem até a um labirinto confuso e sofucante que muda constantemente de forma.
E grito.
E grito. Procuro uma saida. Está escuro. O corpo bate constantemente contra as paredes do medo. E o medo que enlouquece. E o medo que tem medo do medo.
Ausência de luz.
Tropeço contra mim mesmo na busca aflitiva duma porta que permita espreitar os alvores de um novo dia.
Olho-me nos teus olhos
Observo a tua boca
Ausculto a tua respiração
Toco ao de leve a tua pele húmida
Entreabres a boca e
Expiras restos de mágoas e tudo fica bem
As ruas
As pessoas
As árvores
As flores
Os cheiros
O mar
A música tocada pelas ondas do mar
De vez em quando, no horizonte, um veleiro com a vela inchada pelo vento
As casas
Branco, azul, amarelo
Mais branco que azul mais branco que amarelo
O sol
Mais tarde a lua numa das suas fases
A luz, a cor do céu
Velas acesas no interior das casas que iluminam as sombras
que deixam de ser sombras e acalmam os espíritos
Numa varanda um cigarro incandescente desenha no ar figuras efémeras
Mais um dia que é diferente de outros dias
Os dias passam e a idade vai avançando
O tempo esgota-se
E o fim aproxima-se
Inexorável.
A água desagua no fundo dos meus olhos.
As gaivotas voam suavemente, desenhando no transparente ar círculos
e pousam graciosamente no topo da torre sineira da capela empoleirada
no ponto mais alto da falésia
A água é imensa e quase encostada na linha do horizonte um veleiro bolina à boleia do vento,
e a água é empurrada até à costa provocando pequenas ondas que se desfazem em espuma branca.
Forças graníticas emergem poderosas tomando a forma da proa e da ré de um enorme navio naufragado.
Zambujeira do mar, na costa alentejana. No seu chão estão ancoradas casas brancas ornamentadas com faixas amarelas ou azuis como se fossem fitas que encerram as prendas de natal. Ouve-se diferentes falas de gente de diversas origens e paragens que fazem parte integrante da geografia do território como se aqui tivessem nascido e viessem para dizer olá e depois adeus até um dia qualquer que pode ser já amanhã.
Imagino um soldado que, depois da guerra traga o espelho que o acompanhou
nos dias duros, se olhe nele e pense: como o espelho muda; como o rosto muda.
Uma ressonância que se repete
enquanto o vento se mantiver aceso e
a folhagem vibrar com o próprio sopro.
Peço.
Rogo.
A flor nos lábios da boca.
A alma, uma aguarela de canela e alfazema, respira
Saudade.
Pergunto por ti, ninguém sabe;
Apenas que partiste para uma longa viagem, e
que voltarás um dia para resgatares o teu sorriso.
Para ti, estejas onde estiveres, que gostavas muito de a ouvir. Era a tua música...
Até breve, meu amor.
No sítio do costume.
de preferência usar auscultadores
Do outro lado do muro
O avesso, a noite, a respiração ofegante de quem foge de alguma coisa e
Bruscamente um silêncio plúmbeo
Tudo fica parado, suspenso:
Gente, o vento, as árvores, os animais, as águas do rio, do mar, os contadores de histórias e
Até as pedras, todas as pedras.
E as estrelas que, apesar de estarem muito longe,
Deixaram de brilhar.
Os olhos de todos os seres vivos cegaram
Os ouvidos ficaram surdos, as bocas mudas
Os dias já não têm dias e noites, nem horas, nem acordar, nem dormir,
O silêncio é absoluto
Plúmbeo
È o fim.
Infinitamente infinito.
DOMINGO
O ponto de encontro é no sítio do costume
Naquele sítio onde as flores transpiram odores de canela
E os pássaros testemunham os nossos gestos
equilibrando-se sobre os trémulos ramos sacudidos
pela brisa fresca de início de verão.
É domingo.
Estou sentado no banco de ripas vermelhas
Espero e observo:
Não se vê pessoas agitadas, nem apressadas
Apenas o vagaroso deslizar dos corpos distraídos
e aparentemente ausentes,
os namorados trocam furtivos beijos
e tocam-se, contidos.
É domingo
Continuo à espera
Uma banda toca no coreto
e inflama os sentidos
e os corpos involuntariamente
se mexem ao ritmo dos sons
saídos das gargantas dos instrumentos.
É domingo
Continuo à espera.
À tua espera.
Um dia contar-te-ei uma história
se tiver o tempo de várias luas
e a paciência tomar conta de mim
e a sabedoria para reunir todas as palavras
nascidas no fundo da boca.
São corpos pendurados em paredes de sombras, registados em papel com a ajuda de um relâmpago emitido por uma velha máquina fotográfica. Poses artísticas forçadas de pais, avós, filhos dos filhos, tias solteiras, putos ranhosos que também aparecem mas que não foram convidados por falta de espaço e não ser domingo - era o argumento...
Ser fotógrafo era também ser encenador e mestre na arte de dispor as almas nas suas diversas posições e atitudes para, no final, parecerem actores ou figurantes numa cena de teatro burlesco, de marionetes . Era considerado no seu meio e entre os seus pares um verdadeiro mestre na arte de fixar para a posteridade os momentos em memórias que alguém guardaria numa caixa qualquer ou num caixilho que ficaria em equilíbrio numa parede qualquer de um compartimento da casa.
As expressões do rosto e as formas diversas que o corpo assumia reflectiam estados psicológicos, de humor, de hierarquias bem vincadas pela posição de cada um no espaço geográfico da lente da máquina que dava para perceber a importância que cada um tinha e o seu papel na estrutura social e familiar.
Era um verdadeiro alquimista, um mágico que no quarto escuro apenas iluminado por uma luz vermelha conseguia dar vida a películas mergulhadas num caldo químico, como se fosse o útero onde se formava, célula a célula, um corpo que era expulso depois de estar completamente pronto.
Era um poeta que escrevia e fixava um momento da vida para a posteridade.
O vazio está sentado no centro de uma estrela
com a cabeça apoiada num pensamento incolor, transparente, inodoro,
inclinando-se para o lado que o vento soprar
provocando o tédio
bocejando até a boca não poder abrir-se mais
criando um sopro de ar
que circula entre a garganta e o exterior do corpo
situado no limite da vertigem, da tolerância, do vómito
e que devora a vontade de se opôr ao ruído opaco das palavras
sentado ao lado do vazio que deixa de ser, por isso,
o centro da estrela.