Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]
por Orhan Pamuk
Acompanhamos essas histórias como se observássemos uma paisagem e, transformando-a em pintura com os olhos da mente, deixamos que ela nos influencie
Um romance é uma segunda vida. Como os sonhos de que fala o poeta francês Gérard de Nerval, os romances revelam cores e complexidades de nossa vida e são cheios de pessoas, rostos e objetos que julgamos reconhecer. Assim como no sonho, quando lemos um romance, às vezes ficamos tão impressionados com a natureza extraordinária das coisas que nele encontramos que esquecemos onde estamos e nos vemos no meio dos acontecimentos e das pessoas imaginárias que contemplamos. Em tais ocasiões, achamos o mundo fictício que descobrimose apreciamos mais real que o mundo real. O fato de essa segunda vida nos parecer mais real que a realidade muitas vezes indica que substituímos a realidade pelo romance. Ou no mínimo o confundimos com a vida real. Mas nunca lamentamos essa ilusão, essa ingenuidade. Ao contrário, assim como em alguns sonhos, queremos que o romance que estamos lendo prossiga e esperamos que essa segunda vida continue evocando em nós uma sensação consistente de realidade e autenticidade. Apesar do que sabemos sobre a ficção, ficamos irritados e aborrecidos se um romance deixa de sustentar a ilusão de que é, na verdade, a vida real.