Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]
ALEXANDRA DE PINHO (CONTRA-CORPO)
SOLIDÃO
No meio da multidão somos apenas mais um.
Anónimos.
Quase todos se devem sentir assim.
Anónimos,
sem rosto,
iguais a tantos outros,
indistintos,
como se nós fossemos todos e não nós.
Mas subitamente
sentimos que estamos sós
às escuras,
encerrados dentro de um círculo de sombras
em confronto directo connosco
e com os nossos desejos
impulsos
fantasmas
fantasias
frustraçoes.
E vemos
gente que se atropela, que se toca, que se roça.
E vemos
gente perplexa suspensa nos gestos de outrem,
as bocas que se abrem e tomam a forma do espanto.
E os olhos que não pestanejam
hipnotizados pelas luzes vermelhas
das palavras penduradas nas portas
que são um sinal,
um código
que anunciam para iminências urgentes
de corpos ardentes
que buscam o ventre da noite para se tocarem
nos sítios do desejo, e do desespero.
E das janelas dos quartos escorre uma luz coada
que ilumina as silhuetas difusas de corpos nus
que se abraçam
antes que a melancolia da noite chegue
e o prazer dê lugar ao cansaço
ou à desilusão.
E continamos sós.
Apenas nós e a solidão.