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Subo as escadas até ao limite
no último degrau
uma porta em frente
fechada
um muro de silêncio que tem tanto tempo...
devo ultrapassá-la?
Recordo:
As flores a murcharem naquele quarto
Um gato espadachim em cima do armário
Um vento agoirento e frio a escorrer das muralhas
Mulheres novas e viúvas envoltas em xailes negros a derramarem seus
prantos em lágrimas mansas
Um rei sem trono sentado
numa cadeira forrada a tecido grosso esperando
que lhe devolvam o poder do decreto
Caras estúpidas
todas tinham cornos
a olharem de soslaio
É o que recordo
ali parado suspenso no medo
O grilo assobia uma canção ridícula
quem o terá alimentado?
Uma aragem cinzenta anima fantasmas e
partículas de pó dançam o rufar de pandeiretas
Parece haver vida naquele quarto apesar de
há muito tempo não ser habitado
Um palhaço de trapos vermelhos e amarelos
botões no lugar dos olhos
joelhos remendados
escancara a porta e gesticula
palavras infantis que não percebo
É o que recordo de uma noite
de pesadelo
ali parado
já
sem medo.