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#3042 - SEM TÍTULO

por Carlos Pereira \foleirices, em 30.09.19

Talvez a hora tardia e um céu carregado de pragas explique a cidade vazia

e a pressa dos poucos transeuntes em chegar algures

indiferentes e vazios

esgotados, olhos cansados

em busca do seu porto de abrigo ou ao esperado desespero

onde depositarão as dores e a fadiga

porque outro dia já está à espreita e será desesperadamente igual

ao de hoje, ao de ontem e aos dias que já somam anos

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publicado às 22:29


#3041 - MONUMENTO AOS DESAPARECIDOS ||| POEMA DE JUAN MANUEL ROCA

por Carlos Pereira \foleirices, em 30.09.19

JUAN MANUEL ROCA

 

MONUMENTO AOS DESAPARECIDOS

 

Penso nos talismãs

Que ficaram esquecidos num saco,

Nas camisas penduradas que revelam as suas formas

Como se fossem os vestidos

Do vestido dos seus ossos.

Faço um inventário de vazios,

De barcas que encalharam na névoa.

Se é arte de mágicos esfumar-se

Ao virar uma esquina, eles são mágicos?

Se a música é da mesma matéria do silêncio

São música inaudível, um ar escondido no ar?

São corpos desobedientes,

Renitentes a encher de novo um espaço,

A continuar a redigir minutas,

Cumprimentando o vizinho e preparando ao espelho

A cara de ir para o trabalho e voltar a casa?

Se as suas fossem artes encantatórias

Poderíamos deixar abertas as janelas

À espera que voltem

Com os seus barretes de cozinheito e lebres nas mãos,

No fim de um encontro de despedida.

Os parentes atropelam-se nas morgues,

Farejam nos hospitais

Que respiram num ritmo entrecortado,

Vêem os seus rostos passar como as horas

Nas nervosas rotativas dos diários,

Tal como alguns que procuram homens com lanternas

E outros buuscam o seu amor

No gabinete de objectos esquecidos.

Sem nos darmos conta levaram

Com eles uma parte perdida da cidade:

O beco a que ninguém quer regressar,

Um pedaço de ar que espera que o habitem.

Não são fantasmas. Não são endriagos

Enrolando fios na sala de costura,

Filhos da névoa ao despontar do dia.

Uma velha canção que soa a compasso

Faz-nos crer que os encontraremos,

Infiéis ao apelo da casa,

Com os seus sapatos de baile muito reluzentes

No regresso de outra cidade que fizeram sua.

Mas a canção termina,

Ou muda para som de fundo.

Não importa que sejam

o pão sem levedura das estatísticas,

Vagas histórias registadas no livro de perdas.

Ainda têm o rádio ligado no mesmo sítio,

Um amor nalgum lado,

Uma palavra quase a ser pronunciada.

Se voltassem depois de décadas de os esperar

Seriam reconhecidos

Nos retratos pendurados nas paredes,

Nos cartazes amarelecidos da polícia,

Nos panos que levam nos desfiles,

Nos recortes dos jornais antigos

Que guardam entre fotografias os seus parentes?

No copo da noite estão as suas marcas.

Alguns fugiram de si próprios

Tocados pela sombra,

Outros foram metidos em carros fantasmas

Ou levados aos empurrões para o vazio.

Tudo isto me acode quando o presidente da câmara

Com a sua cara de Pierrot,

Com o seu rosto transido à saída do Museu de Arte,

Pergunta a um escultor com que matéria se ergue

Um monumento aos desaparecidos,

Que sem serem sólidos, como os dias e como Deus,

Também se esfumam no ar.

 

POEMA DE JUAN MANUEL ROCA

 

__________________________________________________________________________________________________________

Juan Manuel Roca nasceu em Medellín, Colômbia. Poeta, narrador, ensaísta, crítico de arte e jornalista. Ganhou o II Prémio Nacional de Poesia Eduardo Cote Lamus (1975); o Prémio Nacional de Poesia Universidade de Antioquia (1979); o Prémio Melhor Comentarista de livros Cámara Colombiana del Libro (1992); o Prémio Nacional de Jornalismo Simón Bolívar (1993); o Prémio Nacional de Conto Universidade de Antioquia (2000); o Prémio Nacional de Poesia Ministério da Cultura (2004); o Prémio José Lezama Lima (2007), concedido pela Casa de las Américas, em Havana, Cuba; o Prémio Poetas do Mundo Latino Víctor Sandoval (2007, México); o Prémio Casa de América de Poesia Americana (2009, Madrid); o Prémio Cidade de Zacatecas (2009, México); e o Prémio Estado Crítico (2009) pelo melhor livro de poemas publicado em Espanha, atribuído ao livro Biblia de Pobres. Publicou, entre outros livros de poesia, Luna de Ciegos (1975), Los Ladrones Nocturnos (1977), Señal de Cuervos (1979), Ciudadano de la Noche (1989), La Farmacia del Ángel (1995), Las Hipótesis de Nadie (2005), Estatuas (2010) e Pasaporte del Apátrida (2011). Da sua extensa obra poética, foram publicadas várias antologias, entre as quais: Luna de Ciegos (Joaquín Mortiz, México, 1994), Legar de Apariciones (Ediciones Aurora, Bogotá, 2000), Cantar de Lejanía (Fondo de Cultura Económica, 2005), Cantar de Lejanía (Casa de las Américas, 2008), Botellas de Náufrago (Monte Ávila Editores, Caracas, 2008), Tres Orillas en busca de un Río (La Pluma de Mompox, 2011), De parte de la Noche (Unam, México, 2012), Colofón del Escribiente (Frailejón, Medellín, 2013) e Tres Caras de la Luna (Sílaba Editores, Medellín, 2013). É ainda um autor vastamente traduzido. Em 2003, foi publicada na Suécia a antologia intitulada Korpens Tecken (Señal del Cuervo), de 2003, com traduções de María Kallin e Víctor Rojas; em 2007, a antologia Luna de Ciegos (Blindenmond) foi traduzida para alemão por Tobías e Jana Burghardt; em 2008, o livro Las Hipótesis de Nadie foi traduzido por Stefan Van der Brendt para holandês; em 2009, a editora francesa Myriam Solal publicou a antologia bilingue Voleur de Nuit (francês-espanhol), traduzida por François Michel Durazzo; em 2010, a mesma editora publicou Biblia de Pobres (Bible de Pauvres), traduzida também por François Michel Durazzo, em edição bilingue (francês espanhol).

 

FONTE: WOOK

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publicado às 19:16


#3040 - Outono | Cair da folha

por Carlos Pereira \foleirices, em 30.09.19

 

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publicado às 19:11


#3039 - NÃO ESPERES NADA ||| POEMA DE NICOLÁS SUESCÚN

por Carlos Pereira \foleirices, em 29.09.19

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NICOLÁS SUESCÚN

 

NÃO ESPERES NADA

 

Não esperes nada

do amanhã,

não te sepultes

na esperança,

pensa:

Não verei a luz do novo dia,

esta é a miha última noite.

E bebe

até esqueceres tudo

para o voltares a esquecer,

que essa seja a tua vida,

um vaivém

entre o ser e o não ser.

Não esperes nada

do amanhã,

afunda-te no esquecimento

para que o novo dia

seja verdadeiramente um novo dia,

como se estivesse a começar

a dar voltas o mundo,

como se ir para além

não fosse vir para aqui,

como se a terra não girasse,

enlouquecida.

 

________________________________________________________________________________________

Nicolás Suescún nasceu em Bogotá (Cundinamarca). Poeta, contista, tradutor, editor, jornalista e professor universitário. Fez estudos de literatura, história e humanidades nos  Estados Unidos e França. Ao longo de vários anos dirigiu a revista literária Eco. Traduziu Rimbaud, Flaubert, Ambrose Bierce, W.B. Yeats e Stephen  Crane, entre outros autores. Recebeu o prémio "Vida y Obra 2010": Este galardão bienal é entregue pela Secretaria de Cultura de Bogotá a um artista que tenha dado um contributo fundamental à cultura da capitral.

 

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publicado às 10:07


#3038 - Trabalhos 71

por Carlos Pereira \foleirices, em 13.09.19

 

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publicado às 22:17


#3037 - VARIAÇÕES SOBRE UM PENSAMENTO

por Carlos Pereira \foleirices, em 12.09.19

 

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publicado às 09:27


#3036 - SUNGAZE -Waning

por Carlos Pereira \foleirices, em 11.09.19

 

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publicado às 15:16


#3035 - QUESTÕES DE SEMÂNTICA

por Carlos Pereira \foleirices, em 11.09.19

 

Um problema só é problema se tiver silução; se o problema não tiver solução, então não temos problema.

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publicado às 15:02


#3034 - Trabalhos 33

por Carlos Pereira \foleirices, em 11.09.19

 

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publicado às 14:08


#3033 - OS LIVROS TÊM QUE RESPIRAR

por Carlos Pereira \foleirices, em 10.09.19

 

OS LIVROS TÊM QUE RESPIRAR

 

O livro aberto mostra a página 84

que respira mansamente

no intervalo das palavras

e a pausa para entender o texto

que cintila

nas partículas de pó

como se fossem brilhantes e apoteóticos  papelinhos

lançados para celebrar o final de um  espectáculo.

 

Fecho o livro

suavemente

para não acordar os

vários personagens que o habitam

e deixo no colo da página

um marcador para marcar

o caminho que ainda falta folhear

até aparecer a página com a palavra

"FIM"

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publicado às 18:17

 

EPÍSTOLA PARA UM CISNE

 

Cisne, que não conheces na água o teu reflexo verde

quando sob o teu corpo é dia e o sol afaga quedo

ou quando do teu porte há a sombra negra igual

e tudo o que está negro, e é noite,  e abandono e medo.

Nem concebes o amor, nem Leda, nem sequer eu mesma

que te amo no poema e temo o canto imaginado

que não cantaste agora ou não ouvi, de madrugada

quando  a minha mãe  morta era somente insone.

Nunca viste a beleza, nem a vida e os lábios

que sopram as primeiras e últimas palavras, ou

o hálito que sai sem voz da dor mais desolada.

Nem a doença, a morte e os olhos sem imagens

do ar  e das cores várias viste em que tu vogas branco.

É falso que celebres sozinho a tua morte e o fim,

se não sabes  que só o teu outro cisne se perde.

Mas quando vi insone e logo morta a minha mãe

estou certa de que a cega, a muda, falsa ave cantou.

 

POEMA DE FIAMA HASSE PAIS BRANDÃO IN "OBRA BREVE - POESIA REUNIDA", EDIÇÃO 0976, MAIO 2006, ASSÍRIO & ALVIM

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publicado às 18:30


#3031 - TRABALHOS 69

por Carlos Pereira \foleirices, em 09.09.19

 

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publicado às 12:03


#3030 - Os livros de Agustina Bessa-Luís

por Carlos Pereira \foleirices, em 08.09.19

A editora Relógio d'Água vai lançar durante o mês de Setembro os livros "Vento, Areia e Amoras Bravas" e "O Sermão do  Fogo" de Agustina Bessa-Luís.

 

A editora de Francisco Vale vai publicar, até ao fim do ano, um volume com a correspondência trocada entre Agustina e Juan Rodolfo Wilcock.

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publicado às 19:51


#3029 - SEM TÍTULO

por Carlos Pereira \foleirices, em 06.09.19

E dizes:

o rosto é único 

apenas habitável num

corpo singular com as suas extravagâncias

e particularidades -

os olhos

a boca

a textura dos lábios e do

barco que navega 

nas lágrimas ao

longo da costa da pele e

vai atracar entre

as margens dos pés

que suportam

além do corpo

o peso das dores e

da alma.

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publicado às 21:22


#3028 - SEM TÍTULO

por Carlos Pereira \foleirices, em 04.09.19

 

Um vento incandescente sopra de oeste

incendiando as dunas,

as marés

a lua

e as almas paradas nas ombreiras das portas e janelas

das casas brancas das planícies meridionais

encolhendo ainda mais as rugas da idade e do

desgosto e do tempo da viagem que resta fazer

para se tornarem

oliveiras

sobreiros

laranjeiras e

muitos ramos de cheiros e de

flores.

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publicado às 18:57


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