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#2254 - Sem título

por Carlos Pereira \foleirices, em 31.03.17

Acendes um cigarro, 

Procuras no bar o teu uísque favorito,

Sentas-te no sofá

Soltas o cabelo com 

um gesto gracioso.

Escolhes um livro

abres na página interrompida.

O disco está pronto a ser escutado,

Apuras os sentidos

Relaxas após as primeiras notas do adagietto

da Quinta Sinfonia de Mahler.

Comoves-te

Uma pequena lágrima sublinha

os gestos de Valery Gergiev

e rola até à boca.

Adormeces ao recordar o

teu último beijo na Praça de S. Marcos

em Veneza.

 

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publicado às 18:54


#2253 - CANÇÃO DE VIAGEM NO RIO CHIKUMA

por Carlos Pereira \foleirices, em 31.03.17

 SHIMAZAKI TÓSON (1872-1943)

 

CANÇÃO DE VIAGEM NO RIO CHIKUMA

 

Ontem foi outra vez assim,

Também hoje será assim,

Para quê tanta agitação nesta vida,

Sempre ansiosos pelo dia de amanhã?

 

Muitas vezes desci ao vale

Onde se detém o sonho do crescimento e do declínio

E vi as ondas do rio hesitantes,

Água cheia de areia que enrola e regressa.

 

Ah! A velha mansão - que diz ela?

A ondulação na margem - o que responde?

Em silêncio pensa no tempo que passou,

Cem anos como se fosse ontem.

 

Os salgueiros do Rio Chikuma crescem frágeis:

A Primavera frívola, a água afastando-se.

Sozinho vagueio entre as rochas.

E a esta margem prendo os meus cuidados.

 

Poema do poeta japonês Shimazaki Tóson

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publicado às 18:21


#2252 - Lee Marvin - Wandering Star

por Carlos Pereira \foleirices, em 30.03.17

 

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publicado às 18:56


#2251 - Grandaddy - Aisle Seat 37-D

por Carlos Pereira \foleirices, em 30.03.17

 

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publicado às 18:00


#2250 - Majical Cloudz -​ ​Are You Alone?​ ​-​ ​Downtow

por Carlos Pereira \foleirices, em 30.03.17

 

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publicado às 17:36


#2249 - Questões de Semântica

por Carlos Pereira \foleirices, em 30.03.17

Um homem em cima de outro homem

não o torna mais alto

mais forte

mais sábio

mais generoso

 

Um homem em cima de outro homem

não duplica as suas qualidades

 

Um homem em cima de outro homem

torna-o apenas mais brutal

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publicado às 00:29


#2248 - Sem título

por Carlos Pereira \foleirices, em 29.03.17

Subo as escadas até ao limite

no último degrau

uma porta em frente

fechada

um muro de silêncio que tem tanto tempo...

devo ultrapassá-la?

Recordo:

As flores a murcharem naquele quarto

Um gato espadachim em cima do armário

Um vento agoirento e frio a escorrer das muralhas

Mulheres novas e viúvas envoltas em xailes negros a derramarem seus

prantos em lágrimas mansas

Um rei sem trono sentado

numa cadeira forrada a tecido grosso esperando

que lhe devolvam o poder do decreto

Caras estúpidas

todas tinham cornos

a olharem de soslaio

 

É o que recordo

ali parado suspenso no medo

 

O grilo assobia uma canção ridícula

quem o terá alimentado?

Uma aragem cinzenta anima fantasmas e

partículas de pó dançam o rufar de pandeiretas

Parece haver vida naquele quarto apesar de

há muito tempo não ser habitado

Um palhaço de trapos vermelhos e amarelos

botões no lugar dos olhos

joelhos remendados

escancara a porta e gesticula

palavras infantis que não percebo

 

É o que recordo de uma noite

de pesadelo

ali parado

sem medo.

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publicado às 23:43


#2247 - Alguns ruídos da noite

por Carlos Pereira \foleirices, em 29.03.17

copos de cristal cintilam

na noite brindando a um

aniversariante.

do outro lado alguém

geme baixinho com  mágoas

que esmagam o peito.

um gato cinzento confunde-se com

a noite e 

atropela o meu caminho.

um cão rosna ao farejar o meu andar

alguém espreita na janela do quarto

a chegada de luzes

intermitentes

ruidosas.

e roucas:

urgência;

o vento sopra mansinho anunciando despedidas

alguém parte e

vai ficar para sempre sozinho.

 

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publicado às 23:17


#2246 - Alex Cameron - INTERNET

por Carlos Pereira \foleirices, em 29.03.17

 

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publicado às 16:47

 

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publicado às 16:42


#2244 - Prisioneiros portugueses da primeira guerra mundial

por Carlos Pereira \foleirices, em 29.03.17

A editora Saída de Emergência acaba de editar o livro da investigadora Maria José Oliveira «Prisioneiros Portugueses da Primeira Guerra Mundial - Frente Europeia - 1917/1918»

O livro tem por base o relato de centenas de cartas enviadas pelos expedicionários para as suas famílias e destas para os combatentes e que nunca foram entregues aos seus destinatários, por força da lei da censura prévia imposta a partir de Março de 1916.

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publicado às 16:20


#2243 - DO LIVRO DO DESASSOSSEGO

por Carlos Pereira \foleirices, em 26.03.17

...O velho sem interesse das polainas sujas, que cruzava
freqüentemente comigo às nove e meia da manhã? O caute-
leiro coxo que me maçava inutilmente? O velhote redondo e
corado do charuto à porta da tabacaria? O dono pálido da
tabacaria? O que é feito de todos eles, que, porque os vi e os
tornei a ver, foram parte da minha vida? Amanhã também
eu me sumirei da Rua da Prata, da Rua dos Douradores, da
Rua dos Fanqueiros. Amanhã também eu — a alma que
sente e pensa, o universo que sou para mim — sim, amanhã
eu também serei o que deixou de passar nestas ruas, o que
outros vagamente evocarão com um "o que será dele?". E
tudo quanto faço, tudo quanto sinto, tudo quanto vivo, não
será mais que um transeunte a menos na quotidianidade de
ruas de uma cidade qualquer (...)

 

Fernando Pessoa - Excerto do Livro do Desassossego (Edição Brasileira)

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publicado às 20:07


#2242 - 1976

por Carlos Pereira \foleirices, em 26.03.17

 LUIS MAFFEI

 

1976

 

A palavra formiga é muito longa para ser formiga

O boi não cabe em suas letrinhas

Armário escrito num papel colado ao puxador não

cria um outro armário sobre o armário nem

desmata o que foi mata e já se desmatou há muito

nem desmata o armário morto pelo texto que o inventa só

na morte Isso

tudo é educação pelas perdas que bem se têm

que mal se veem

que só se notam quando é noite a gente sua

e chora como quem responde ao mundo uma resposta muito

boi pouco formiga

e entende

aos poucos

que é por pouco que não fomos concluídos bem no instante de

nascermos que é

um pouco

ir para a vida ir para a morte

ir a palavras como boi como fer

mento muito curta para ser de au

mento muito longa para ser um

boi Isso era educação caso não

fosse noite mal dormida como nunca uma vigília a imitará quando

palavras forem vozes de uma vida que

sem jeito

se encontra a si em poça de suor e urina e cabelos ensebados

pelo medo pelo armário sem

amante nem vestido sem

infância com

infância demais quando não falo

e mais quando só falo e falo dessa infância onde tudo fica ainda e quando boi

era formiga e um mendicante amor de tudo era o

futuro em que

(é agora?)

mendigo ainda e sei que tu mendigas pelo avesso o mesmo

extremo encontro a mesma aberta

cárie a mesma morte que me abraça como

um urso e consegue a criação da vida inteira e o suadouro das palavras

que usam boca e ressuscitam

 

Poema do poeta brasileiro Luis Maffei

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publicado às 18:15

 EDUARDO LOURENÇO

MIGUEL GONÇALVES MENDES

 

Baseado no ensaio de Eduardo Lourenço publicado em 1978 e com o  título "O Labirinto da Saudade - Psicanálise Mítica do Destino Português", Miguel Gonçalves Mendes finaliza o documentário com e sobre Eduardo Lourenço. Este documentário procura revelar o percurso pessoal e literário de Eduardo Lourenço.

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publicado às 16:14


#2240 - PRIVILÉGIOS DO POBRE

por Carlos Pereira \foleirices, em 26.03.17

JUAN DEL VALLE Y CAVIEDES (1652-1696)

 

PRIVILÉGIOS DO POBRE

 

             Se se cala, o pobre é parvo;

um maçador, se é palreiro;

bisbilhoteiro, se sabe;

se afável, é embusteiro;

se é gentil, intrometido,

se não atura, é soberbo;

cobarde, quando é humilde,

se é audaz, não possui tento;

se é valente, é temerário;

presunçoso, se é discreto;

adulador, se obedece,

se algo recusa, é grosseiro;

com pretensões, atrevido;

com méritos, não ganha apreço;

sua nobreza é oculta,

sua veste sem esmero;

se trabalha, é ambicioso,

e, pelo contrário extremo,

um perdido, se descansa...

Vejam bem que privilégio!

 

POEMA DO POETA PERUANO JUAN DEL VALLE Y CAVIEDES

 

 

 

 

 

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publicado às 15:41


#2239 - Festival PortoCartoon - 19.ª Edição

por Carlos Pereira \foleirices, em 25.03.17

Cartoon vencedor

 

O cartoonista belga Luc Vernimmen é o grande vencedor da 19.ª edição do festival PortoCartoon, que teve como tema o turismo.

A obra satírica Sustainable Tourism denuncia “a atracção das pessoas pela morbidez”, explica Luiz Humberto Marques, membro do júri e director do Museu Nacional da Imprensa, que todos os anos organiza o festival. O desenho mostra em primeiro plano um autocarro vermelho onde se lê “Syria City Tour” e que transporta um grupo de turistas. As pessoas, algumas dentro e outras fora do autocarro, fotografam o “drama da destruição” que a guerra provocou no país.

Jitet Kustana, da Indonésia, recebeu o segundo prémio com a obra Sunbathing in the Beach, e o terceiro lugar foi para Ángel Boligán, do México, com uma representação do muro que Donald Trump prometeu construir a formar a lâmina de uma guilhotina.

 

 

2.º Lugar

3.º Lugar

 

 Artigo de RENATA MONTEIRO - Jornal Público online

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publicado às 21:35


#2238 - The book of love

por Carlos Pereira \foleirices, em 25.03.17

 

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publicado às 21:26


#2237 - UM A MENOS

por Carlos Pereira \foleirices, em 25.03.17

 LEONARDO MARONA

 

UM A MENOS

 

por ora os abutres sobrevoam

a lagoa fetal e, muito em breve já munidos

com as devidas garras de enxofre,

eles darão o rasante metálico

e tudo isso será apenas uma história,

um mito, um-terá-alguma-vez-acontecido,

mas os amantes estarão esfarelados

em suas carnes antigas, abraçados numa confusão pagã

a carne nova estará no balcão vermelho dos negócios de feira,

as breves frases delicadas ter-se-ão tornado

bustos pesados de paz em vírus.

 

a galope o pequeno órgão ratifica

a vaga culpa, estamos nus sob um sol desdenhoso,

não há realmente porque falar sobre isso com ninguém.

as salas minúsuculas e os alquimistas calvos

afunilaram o ambiente com paciência e muito ânimo.

serás processado, triturado e lançado ao acaso

em tua própria tendência succínica, e não será possível

abrir mão deste silêncio como osso tranca-traqueia,

ainda nem uma cabeça, um todo

germinal que no entanto pulsa.

 

a morte da grécia está nas ruas

e já não poderei vê-la porque a partir de agora

os olhos forçam para dentro as mágoas,

as covas rasas se alinham ao ventre,

não há realmente porque falar sobre isso com ninguém.

entende-se que a morte do pai reaproxima o par,

pois que assim seja, saberemos renunciar

a qualquer passado por uma nova vida, daremos

as mãos em nosso pior inverno, riremos como clowns

e poderemos até assaltar um banco, costuraremos

as máscaras dos sorrisos heróicos e caminharemos

com um pedaço a menos, adiante.

 

Poema do poeta brasileiro Leonardo Marona

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publicado às 19:46

Que surpresa nos vai trazer a religião de Khalid Masood? Sem qualquer pista, por enquanto, aguardemos

Na manhã de ontem, a primeira-ministra britânica Theresa May forneceu alguns dados sobre o autor do atentado da véspera, em Westminster, na vizinhança do Parlamento. May disse que ele era "britânico de nascimento" e tinha sido investigado há alguns anos por extremismo violento, pelo MI-5 (as secretas para a segurança interna). E ela acrescentou que o terrorista não estava atualmente sujeito ao radar das polícias. O jornal The Guardian confirmou esta informação: o homem não estava entre os 800 indivíduos do núcleo duro que a polícia seguia, nem tão-pouco do círculo mais largo de três mil suspeitos. Entre todas estas especificações talvez nenhuma fosse mais reveladora do que esse "britânico de nascimento", que a primeira-ministra se achou obrigada a dar.

Horas antes da declaração de May, tinha sido lançada uma campanha de Nigel Farage contra a política laxista nas fronteiras, permitindo que os terroristas as atravessem ao deus-dará - como o atentado, dizia ele, demonstrava. No ano passado, já Farage e o seu partido, o UKIP, levaram o primeiro-ministro David Cameron a convocar o referendo do brexit. Era uma manobra para mostrar que os nacionalistas extremistas, que andavam a mordiscar o eleitorado conservador, não tinham tanta força como se supunha... Mas o brexit venceu, Cameron mordeu o pó e demitiu-se. A sua sucessora, Theresa May, preferiu não menorizar o poder de Farage e apressou-se a combater a ideia que ele fazia passar. O homem do atentado era bem um britânico feito em casa, não um terrorista importado!

 

 

 

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publicado às 11:37


#2235 - O II volume da Bíblia já disponível nas Livrarias

por Carlos Pereira \foleirices, em 23.03.17

O segundo volume da Bíblia traduzida por Frederico Lourenço chega hoje às livrarias e conta com os textos Atos dos Apóstolos, Epístolas e Apocalipse, ficando assim finalizada a publicação do Novo Testamento.

 

LER MAIS

 

 

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publicado às 15:56


#2234 - Feridas na paisagem - Instalação

por Carlos Pereira \foleirices, em 23.03.17

 

"FERIDAS NA PAISAGEM"  é o nome de uma "Instalação" que pode ser vista todos os dias e a qualquer hora, situada na zona verde junto das piscinas municipais em Santa Maria da Feira.

 

 

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publicado às 15:35


#2233 - Notícias do Norte

por Carlos Pereira \foleirices, em 22.03.17

A notícia espalhou-se pela noite fora como incêndio em palheiro farto. As corujas assustadas procuraram novos poleiros. A notícia soava terrível: Um rato pariu uma montanha, dissera-lhes o vento soprado do norte. Interrogaram-se "como é possível alguém tão minúsculo transportar no corpo tamanho pecado!".

 

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publicado às 19:12


#2232 - São do Sul os borrachões

por Carlos Pereira \foleirices, em 22.03.17

 

um pequeno homem

atarracado

com calosidades no cérebro

grita palavras musculadas

em cima de um palanque

 

vestido de fato e gravata

com ar grave

a baba a escorrer

como se tivesse um orgasmo

 

o pequeno homem  grunhe

frases patetas e

na multidão há quem urre

e de um gole mame uma «bojeca»

 

os que conseguem resistir a

tamanha imbecilidade

viram-lhe as costas e

mostram-lhe o traseiro

 

O pequeno homem fica vidrado

e de cima do palanque grita:

são do sul, os borrachões

os «putanheiros»

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publicado às 16:09


#2231 - O tempo dos homens pequenos

por Carlos Pereira \foleirices, em 22.03.17

Vivemos o tempo dos pequenos homens: imbecis, arrogantes, ignorantes, incultos

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publicado às 15:26


#2230 - O escritor que imaginou Trump em 1935

por Carlos Pereira \foleirices, em 22.03.17

 Sinclair Lewis imaginou um candidato à presidência machista, xenófobo e populista que prometia uma nova grandeza para os EUA

 

In "El País Brasil"

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publicado às 14:25


#2229 - Sem título

por Carlos Pereira \foleirices, em 22.03.17

Um homem parado na esquina dum

beco feio e triste ladra

com o cão seu companheiro de viagem;

O cão ladra com o homem seu

companheiro de viagem;

um diálogo filosófico sobre a

pertinência das suas vidas que transportam

num pequeno saco de plástico

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publicado às 14:00


#2228 - Sem título

por Carlos Pereira \foleirices, em 22.03.17

Não posso conter mais o

silêncio das sombras que habitam as

casas adormecidas

reclamam luz

precisam de ar

a alma quer respirar

 

Um grito 

rebenta o peito

a língua

um grande alento

e a boca sacode as letras

há tanto tempo paradas

nas últimas camadas 

do corpo

 

 

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publicado às 13:10


#2227 - JUNIO BARRETO - Bonita de pedra e céu

por Carlos Pereira \foleirices, em 21.03.17

 

 

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publicado às 22:05


#2226 - Por favor, desliga a tv

por Carlos Pereira \foleirices, em 21.03.17

POR FAVOR, DESLIGA A TV

contas-me uma história?

uma história com estórias.

que fale de chuva, de gotas de orvalho, de esperança.

de pessoas não;

já me aborrecem

provocam bocejos de tédio,

dizem sempre as mesmas coisas,

aparecem sempre nos mesmos lugares nem que seja em sítios diferentes;

põem-se em bicos de pé,

entram-nos pela casa adentro,

não pedem licença; são rudes não têm pudor.

Não... não fales de pessoas, essas vejo-as todos os dias disfarçadas em roupas de papel,

ou em gritantes anúncios em néon.

Conta-me uma história de

estórias simples, singelas,

não importa que sejam absurdas,

mas, por favor,

desliga a televisão.

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publicado às 19:01


#2225 - Os 10 romances mais importantes da literatura brasileira

por Carlos Pereira \foleirices, em 21.03.17

 

POR MIGUEL SANCHES NETO 

 

As listas são um instrumento crítico de grande relevância, pois trazem, subjacente, um conceito de literatura — este conceito talvez seja mais importante do que as obras escaladas. Ao escolher apenas dez romances brasileiros eternos, segui alguns critérios: não repetiria livros do mesmo autor; privilegiaria obras que trouxeram alguma inovação formal; e daria preferência a livros que fossem mais do que uma história, que tivessem um valor metonímico, representando um período literário, um painel histórico, um grupo social, uma tendência estética. Podem ser considerados como marcas comuns a todas as narrativas listadas o desejo de construir um retrato do Brasil e o investimento em uma linguagem identitária — cada título, logicamente, à sua maneira. Teríamos aqui então um pequeno mapa do grande romance nacional.

Miguel Sanches Neto, doutor em Teoria Literária pela Unicamp, é autor, entre outros, dos romances “Chove Sobre Minha Infância” (Record), “Um Amor Anarquista (Record)” e “A Máquina de Madeira”.

 

IN "REVISTA BULA"

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publicado às 15:35


#2224 - ACERTO

por Carlos Pereira \foleirices, em 20.03.17

 LAURA ASSIS

 

ACERTO

 

Eu entendo
as variações
e não importa
onde você está,
espaço e tempo
são só equações.

Imagem e movimento

são sinais
ou projeções
que preparo
ou aparto
enquanto escuto
passos
em outra direção.

Eu desenho
traços,
pontos exatos,
rabiscos.

Sempre há risco
mas a vida é bem
mais difícil
que isso.

O resto é abismo
e de noite existe
essa matéria
invisível
inventando desvios
nas palavras
que você ainda
não aprendeu
a dizer.

 

Poema de Laura Assis, poeta brasileira

 

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publicado às 22:44


#2223 - Recuperar uma crónica escrita em Setembro de 2008

por Carlos Pereira \foleirices, em 20.03.17

Parece que nada mudou... ou quase nada

 

Desconfianças e enganos

por Carlos Pereira \foleirices, em 30.09.08
 

Há muito tempo que desconfio de algumas palavras e termos usados no mundo da economia, das finanças, dos negócios, da política, do futebol, da justiça, da saúde, do ensino, da cultura...

 

Há muito tempo que desconfio da inteligência, da seriedade, da bondade de comentadores, analistas e estrategas...

 

Há muito  tempo que desconfio daqueles que aparecem nas televisões  a debitarem opiniões sobre tudo, mesmo que não entendam nada  da poda....

 

Há muito tempo que desconfio daqueles que estão confortavelmente sentados em cima do dinheiro e têm o desplante de darem palpites sobre as nossas vidas, desconhecendo, em absoluto, as realidades económicas, sociais, culturais e as diversas geografias humanas de um mundo onde não penetram porque vivem em redomas confortáveis,  e distantes das vivências rudes, cruas, amargas e negras da maioria das gentes que povoam este planeta.

 

Desconfio dos "gurus" que apenas têm como objectivo ganhar muito dinheiro em livros e conferências por "ideias" desenhadas em noites de insónias, e vendidas nas feiras da ganância como banha-da-cobra.

 

Desconfio dos "engenheiros financeiros???" que constroem fortunas suportadas em estratagemas do "chico espertismo".

 

Desconfio daqueles que defenderam de forma esquizofrénica a invasão do Iraque porque era preciso descobrir e destruir armas com grande poder destrutivo e que a operação duraria o tempo de vida de uma borboleta.

 

Desconfio daqueles que vêm o mercado como se este fosse apenas o único meio de  atingirmos a redenção das nossas vidas e nada mais houvesse para além dele senão o vazio.

 

Desconfio daqueles que apenas falam de números e que nunca leram livros de história, geografia, filosofia, sociologia, poemas.

 

Desconfio daqueles que não sonham.

 

Desconfio daqueles que não brincam.

 

Desconfio daqueles que nos tratam de forma paternalista como se fossemos um bando de imbecis.

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publicado às 21:47


#2222 - POR FIM, A RUPTURA

por Carlos Pereira \foleirices, em 20.03.17

Parado no tempo

no centro do círculo um homem desenha à pena a vida que nunca viveu

as palavras que nunca disse

os livros que nunca leu

as cores do som de um bando de pardais que nunca escutou

os filhos que nunca amou

as mulheres com quem nada partilhou;

já nada tem, já nada quer somente o

poder de decidir que final

terá o desenho:

será breve

apenas um instante

após um profundo e prolongado lamento.

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publicado às 18:31


#2221 - DEITADO COM O DEDO NA BOCA

por Carlos Pereira \foleirices, em 19.03.17

 ALICE SANT'ANA

 

DEITADO COM O DEDO NA BOCA

 

deitado com o dedo na boca

o sorriso invertido

curvado como uma montanha

a pele da perna uma cédula

gasta e seca

todos os dias rigorosamente iguais

banheiro, visitas, ampolas de sangue

às vezes tem mordomias como

um pedaço de pão ou uma fruta

doces nem pensar

da janela passa uma nuvem de carros

um táxi amarelo convida

a ir a qualquer lugar

sem previsão de alta o táxi é mais

uma miragem um filme

na televisão aquele programa da tv5

sobres casas em paris sem saneamento

pessoas que moram hoje, você acredita?, em quartos

sem janelas, apartamentos no sexto andar

sem elevador, como será que fazem para subir

com a água? não tomam banho, naturalmente

depois se cansa da conversa

a nuvem se torna mais espessa

na hora do rush o táxi não tem serventia

se não puder tomar o caminho que leva

ao ponto mais alto

de onde se vê a curvatura da terra

 

Poema da poeta brasileira Alice Sant'Ana

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publicado às 12:52


#2220 - MEMÓRIAS ESCONDIDAS NAS ESTRIAS DE UM DISCO DE VINIL

por Carlos Pereira \foleirices, em 18.03.17

 Serge Reggiani

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publicado às 23:14


#2219 - Real Estate - Had To Hear

por Carlos Pereira \foleirices, em 18.03.17

 

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publicado às 23:06


#2218 - UM ARCO-ÍRIS COMPLETAMENTE VULGAR

por Carlos Pereira \foleirices, em 18.03.17

 LES MURRAY

 

UM ARCO-ÍRIS COMPLETAMENTE VULGAR

 

Ouve-se dizer em Repins,

o boato segue por Lorenzinis,

em Tattersalls, homens levantam os olhos de folhas de números,

os escrevinhadores da Bolsa esquecem o giz que têm na mão

e homens com pão nos bolsos saem do Clube Grego:

Há  um tipo que chora em Martin Place. Não o conseguem deter.

 

O tráfico em George Street está engarrafado meio quilómetro,

sem se mover. As multidões conversam nervosamente

e mais multidões chegam a correr. Muitos atropelam-se em ruas laterais

que minutos antes eram atarefadas ruas principais, apontando:

Há um tipo que chora lá em baixo. Ninguém o consegue deter.

 

O homem que rodeamos, o homem de que ninguém se aproxima

chora simplesmente e nem sequer o esconde, não chora

como uma criança, nem como o vento, chora como um homem

e não o proclama, nem bate no peito, nem sequer

soluça muito alto - mas a dignidade do seu choro

 

mantém-nos afastados do seu espaço, do vazio que constrói à sua volta

na luz do meio-dia, no seu pentagrama de dor

e os funcionários na multidão que o tentam agarrar

olham para ele, abismados, com o espírito

desejando lágrimas como crianças um arco-íris.

 

Alguns dirão, anos depois, que havia uma auréola

ou um campo de força à sua volta. Não há nada disso.

Alguns dirão que se sentiram chocados e o teriam detido,

mas esses não estiveram lá. A virilidade mais bravia,

a reserva mais áspera, a inteligência mais astuta ali presente

 

treme em silêncio, e arde com juízos

inesperados de paz. No ajuntamento alguns gritam,

que se julgavam felizes. Só as crianças mais pequenas

e os que parecem ter saído do Paraíso se acercam dele

e sentam-se aos seus pés, junto de cães e pombos sujos de pó.

 

Ridículo, diz um homem perto de mim, e tapa

a boca com as mãos como se tivesse pronunciado um vómito - 

e vejo uma mulher, brilhando, estender a mão

e tremer quando recebe a dádiva do choro;

todos quantos a seguem também a recebem

 

e muitos choram só por terem aceite e muitos mais

recusam-se a chorar com medo de toda a aceitação,

mas o homem que chora, como a terra, nada exige,

o homem que chora ignora-nos, e o que na

sua face contorcida e no seu corpo vulgar ele exclama

 

não são palavras, mas dor, não são mensagens, mas pena,

duras como a terra, simples, existentes como o mar.

E quando pára, caminha placidamente por entre nós

limpando a cara com a dignidade de um

homem que chorou e agora acabou de chorar.

 

Evitando crentes, ele apressa-se pela Pitt Street.

 

Poema do poeta australiano LES MURRAY

 

 

 

 

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publicado às 18:18


#2217 - REFLEXOS

por Carlos Pereira \foleirices, em 17.03.17

REFLEXOS

 

A cadeira está vazia.

tem muita idade.

cansada

de tanto sentar.

reformou-se.

está suspensa do tecto

em teias de aranha.

está a descansar.

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publicado às 23:44


#2216 - ANOTAR FORTUITAMENTE O BRANCO

por Carlos Pereira \foleirices, em 17.03.17

 

 ANNITA COSTA MALUFE

 

ANOTAR FORTUITAMENTE O BRANCO

 

anotar fortuitamente o branco o

contorno do vidro modulando o

branco do céu anotar como quem

anota rapidamente um recado as

letras dando a entender um nome

o vidro embaçado pela maresia

a planta fina que cresce entre as telhas

úmidas anote o que digo mas rápido

a voz tem um sotaque rápido ou

lento não sei bem o nome

de onde? um sotaque não me lembro

não faz sentido os nomes são

sempre os mesmos fortuitamente

anoto o contorno que modula veja

o tom de branco esgarçando

aqui rapidamente anote o que

digo entre as telhas na primavera

costuma ser nesta época não sei

de onde este sotaque este modo

de esticar o «r» eu acho que é

nesta época esta planta fina os ramos

costumo anotar mas rapidamente

o contorno se desfaz em seguida e

é entre as telhas na infiltração dos dias

um reflexo automático nisto

de falar da morte e em seguida

olhar o relógio

 

«Há uma espécie de reflexo automático nisso de falar da morte e, em seguida, olhar o relógio.»

M. Benedetti, A trégua

 

Poema de Annita Costa Malufe, poeta brasileira

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publicado às 23:08


#2215 - Derek Walcott, poeta, morre aos 87 anos

por Carlos Pereira \foleirices, em 17.03.17

Derek Walcott, poeta caribenho, Prémio Nobel da Literatura em 1992 e galardoado com vários prémios literários e académicos, morre aos 87 anos. 

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publicado às 19:46

 Notícia retirada do Jornal on-line DIÁRIO DE NOTÍCIAS

 

 

Este tipo de intervenção "tem ainda a vantagem de diminuir a exposição do doente ao ambiente hospitalar e de reduzir os inerentes custos do SNS com essa estadia", de acordo com Miguel Paiva

O Centro Hospitalar  de Entre Douro e Vouga (CHEDV) revelou esta sexta-feira ter realizado com sucesso as primeiras cirurgias endoscópicas a hérnias discais pelo Serviço Nacional de Saúde, num procedimento menos invasivo, com agressão mínima e mais fácil recuperação.

Em causa estão quatro discectomias (excisão parcial ou total de um disco intervertebral herniado) lombares totalmente endoscópicas, realizadas em Santa Maria da Feira pelo Serviço de Ortopedia e Unidade de Coluna do Hospital São Sebastião, que é um dos três sob administração do CHEDV.

"O Hospital São Sebastião é o primeiro hospital público do país a realizar esta cirurgia inovadora que, sendo muito menos invasiva do que uma intervenção convencional aberta, representa maior conforto para o doente e menos tempo de internamento pós-cirúrgico", declarou à Lusa Miguel Paiva, presidente do conselho de administração do CHEDV.

 

 

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publicado às 19:27


#2213 - Responda se souber; se não souber especule, invente

por Carlos Pereira \foleirices, em 16.03.17

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As imagens dizem respeito a um espaço situado no coração da cidade de Santa Maria da Feira, junto das piscinas municipais.

 

Proponho que responda ao seguinte questionário:

 

(Responda se souber... Se não souber faça como alguns políticos, alguns comentadores, alguns jornalistas: especule, invente.)

 

1 - É um «sítio» arqueológico

2 - Espaço onde se experimenta e ensaia novos conceitos de arquitectura e "design"

3 - Uma aldeia abandonada depois de ser atacada por melgas

4 - Cenário de um "western"

5 - Desleixo, desmazelo, incúria

6 - Novas perspectivas de integração de construções na paisagem

7 - Novos conceitos de promoção turística

8 - Novas formas de "ver" e "ocupar" o espaço público e o território

9 - ........................................................................................................

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publicado às 18:24


#2212 - Comprou Brincos de Âmbar

por Carlos Pereira \foleirices, em 16.03.17

ALICE SANT'ANNA 

 

COMPROU BRINCOS DE ÂMBAR

 

comprou brincos de âmbar

porque alguém disse

que se juntasse a cor da pele

com a dos olhos e dos cabelos

a soma seria âmbar

no telefone ela sorri muito

mexe a cabeça para que os brincos

pendurados batam no fio

assim ela lembra que está de brincos

assim ela lembra que tanta gente passa uma vida

inteira sem saber qual é a soma

de todas as cores

e eu já encontrei a minha, ela diz

cheia de dentes (os dentes

imagino do outro lado da linha)

conta que tem dormido pouco

acorda sonolenta

não lembra nunca do que sonhou

ou fala isso porque no fundo os sonhos

são inconfessáveis

até para o analista teria vergonha

de repente uma longa pausa

e se os sonhos fossem

subitamente proibidos?

ela pergunta dramática

diz que não vai ter pressa

o mapa astral diz para não ter pressa

não vou acumular dívidas

minha vida será confortável

um amor e filhos será possível

enrosca o âmbar com o indicador

aperta a pedra até não quebrar

um amor que ainda vai acontecer

a astróloga a aconselhou a viajar

vai comprar um anel em cada canto do mundo

precisa usar os anéis todos juntos

uma mão toda de prata quase uma luva

depois perder os anéis um por um

especialmente aquele com a pedra âmbar

dizer que tomou todo cuidado possível

para não perder os anéis

mas todo cuidado não previne do frio

que afina os ossos no inverno

e faz com que os anéis deslizem e se lancem

não previne dos assaltantes

nem dos lapsos em quartos de hotel

nem das pessoas que pedem

para ficar com um lembrete uma recordação

todo cuidado não elimina sequer a vontade

de esquecer o anel de propósito

 

POEMA DE ALICE SANT'ANA, POETA BRASILEIRA

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publicado às 17:59

 

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publicado às 23:03


#2209 - Sem título

por Carlos Pereira \foleirices, em 13.03.17
 

foto de alberto viana d'almeida

 

Sentada na raiz do pessegueiro

esperas que a lua amadureça.

olhas o livro

olhas as horas

olhas o sol

olhas as sombras

olhas o fim-de-tarde

olhas o início da noite

olhas o início do fim

e continuas sentada à

espera da lua cheia

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publicado às 22:56


#2210 - Red House Painters - Katy Song

por Carlos Pereira \foleirices, em 13.03.17

 

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publicado às 22:54


#2208 - Memórias escondidas nas estrias de um disco de vinil

por Carlos Pereira \foleirices, em 13.03.17

 "Il n'y a pas d'amour heureux"  -  Françoise Hardy

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publicado às 22:36


#2207 - Questões de Semântica

por Carlos Pereira \foleirices, em 13.03.17

Só a Luz  (conhecimento) tem o poder de incendiar e iluminar as trevas.

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publicado às 22:22


#2206 - Questões de Semântica

por Carlos Pereira \foleirices, em 11.03.17

O silêncio é muitas vezes mais eloquente que o ruído das grandes declarações.

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publicado às 15:50

 À Nininha, com muito amor.

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publicado às 14:59


#2204 - SHIGERU UMEBAYASHI ~ ''Train''

por Carlos Pereira \foleirices, em 09.03.17

 

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publicado às 23:18


#2203 - O MEU IRMÃO ABEL, O FERIDO

por Carlos Pereira \foleirices, em 09.03.17

 PHILIP LEVINE

 

O MEU IRMÃO ABEL, O FERIDO

 

Ele desenhou o nosso futuro na poeira

com uma faca partida que guardava

escondida numa garrafa verde de vinho

sob o sicômoro. Um círculo significava

um ano absolutamente perfeito.

Uma linha recta significava, o quê?

- ele não dizia, rindo quando

eu perguntava e repetindo: «É melhor não

saber mais do que o necessário.»

Em breve eu teria dezasseis anos,

pequeno para a idade, mas sem medo,

talvez por ele desenhar um grande

X e que chamava a nossa virilidade.

«A partir de agora» disse ele «eu e tu

não daremos quartel e não o pediremos.»

Foi no Março em que plantei rosas

junto à cerca das traseiras, e nevou

quase até ao verão, o ano

em que encontrei margaridas africanas

e as roubei do quintal do vizinho

para plantar no meu. Mais tarde quando a guerra

escureceu os cabeçalhos, e eu

recolhi garrafas de cerveja no beco

para trocar  por sementes de nabo e plantar

ruibarbo e rezei para que o frio

não viesse, acordava no escuro

e via-o debruçado no relógio

a qualquer hora. De manhã

encontrava bandeiras negras pintadas

pela costa norte de África,

negro para eles, negro para nós,

até um dia o mapa desaparecer

e ele se dedicar a passeios noite fora,

mesmo durante as grandes chuvadas de outono,

enquanto nas janelas a minha cara

se esfumava, enquanto o telhado ressoava

no ritmo persistente do nosso sangue

até que eu cai num sono de inverno

sem sonhos de que ele nunca acordou.

 

POEMA DE PHILIP LEVINE

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publicado às 13:25


#2202 - O PODER DE CIRCE

por Carlos Pereira \foleirices, em 09.03.17

 LOUISE GLÜCK

 

O PODER DE CIRCE

 

Nunca transformei ninguém em porco.

Algumas pessoas são porcos; faço-os

parecerem-se a porcos.

 

Estou farta do vosso mundo

que permite que o exterior disfarce o interior.

 

Os teus homens não eram maus;

uma vida indisciplinada

fez-lhes isso. Como porcos,

sob o meu cuidado

e das minhas ajudantes,

tornaram-se mais dóceis.

 

Depois reverti o encanto,

mostrando-te a minha boa vontade

e o meu poder. Eu vi

 

que poderíamos ser aqui felizes, 

como o são os homens e as mulheres

de exigências simples. Ao mesmo tempo,

 

previ a tua partida,

os teus homens, com a minha ajuda, sujeitando

o mar ruidoso e sobressaltado. Pensas

 

que algumas lágrimas me perturbam? Meu amigo,

toda a feiticeira tem

um coração pragmático; ninguém

 

vê o essencial que não possa

enfrentar os limites. Se apenas te quisesse ter

 

podia ter-te aprisionado.

 

 

Poema de Louise Glück

 

 

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publicado às 13:04


#2201 - Alguns não deviam estranhar certos factos na cidade de Lima

por Carlos Pereira \foleirices, em 08.03.17

 ALGUNS NÃO DEVERIAM ESTRANHAR CERTOS FACTOS NA CIDADE DE LIMA

 

Erny:

teu olhar é como um rifle belga automático

- ano 1936 - 

cheio de balas e um projéctil na culatra

para os dias húmidos na lembrança.

Para os lagos e o crespúculo.

Para os pequenos túmulos na berma das estradas.

A invasão do povoado palidamente sujo.

Para as cidades que adivinharam o meu regresso

Depois da madrugada, com a máquina fotográfica

com o seu olho eléctrico a descansar sobtre o abdómen.

Não é estranho para ti, velho Erny,

que és um búfalo à deriva num safari,

quando teu rosto sorri como o sol em Macchu Pichu,

ver-me a caminhar às margens do Rimac com uma bela

e suave mulher a escrever o seu nome em grandes combates

e sorri sempre das histórias que eu desconhecia,

a descobrir os factos quando as grandes

civilizações do seu sorriso revelavam acontecimentos.

Velho Erny,

apontavas o teu rifle entre a folhagem

às vezes vermelha, outras vezes violeta.

Nada é estranho para ti, velho corvo,

que me observas a correr em direcção ao mar próximo de Lima

e calar diante das ruínas que silenciam as coisas.

Algo assim como a pesca de atum perto da Florida

ou a caça em Bengala.

Nada é insólito para ti, que viu-me regreassar

a esta cidade sem razão aparente.

É óbvio que poderia amar

a adolescente durante o bombardeio de uma cidade

com corpos despedaçados.

Volto com a minha máquina fotográfica,

com a sua lente intacta na escuridão,

com o desejo cego de pássaros selvagens

que se arrojam em voo ao desconhecido.

Como a velharia que pensou esquecer

como se esquecem so desencontros e as indecisões

entre filmes de 35mm. E os fantasmas da fotossíntese.

Com temor não à dor

mas à inevitabilidade dos tornados que se formam na costa sul

e arrastam em confusão ódios e rancores,

árvores e algas marinhas.

Como os que afirmaram ser desta terra.

Com tua barba de feiticeiro,

és capaz de apontar com firmeza o rifle belga

do ano trinta e seis,

não ver os pássaros nem as nuvens de Kilimanjaro,

nem o relâmpago dos cantos de fúria das  minhas memórias,

manejas o gatilho como se colocasses um disco de Mozart,

puxas a trava da arma e tens consciência que a bala está na agulha,

sóbria e oculta,

como uma mulher no instante derradeiro do amor, no último

suspiro.

Sempre o mesmo facto. O compassado e eficaz acto

de accionar o gatilho, sentindo-se rei.

Porque agora meu caro Erny,

a terra se ergue como altas catapultas

rubras ou verdes ou violetas

sobre as escarpas íngremes que lamentam o mar

e o meu corpo a cair ao chão

ferido de sangue e solidão pelas águias  da noite.

 

POEMA DE MANUEL RUANO, POETA ARGENTINO

 

 

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publicado às 21:32


#2200 - Nils Frahm — Because This Must Be

por Carlos Pereira \foleirices, em 08.03.17

 

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publicado às 21:23


#2199 - Goodbye Ivan - "Untitled #11"

por Carlos Pereira \foleirices, em 07.03.17

 

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publicado às 21:57

Entrevista da responsabilidade de João Céu e Silva - Jornal Diário de Notícias

 

O historiador britânico Timothy Garton Ash critica os algoritmos pouco éticos das super poderosas Google, Facebook, Amazon e Apple na manipulação da verdade dos acontecimentos mundiais.

O historiador britânico e analista Timothy Garton Ash acaba de publicar em Portugal a sua mais recente investigação: A liberdade de expressão - Dez princípios para um mundo interligado. Um livro em que continua o debate sobre a dificuldade de o cidadão se emancipar de algoritmos pouco éticos da Google, Facebook, Amazon ou Apple quando quer formar uma opinião isenta sobre os acontecimentos mundiais. Um debate que já mantém num site em que a língua portuguesa é uma das treze usadas

.

Resume a atualidade marcada pela Internet logo à primeira frase do livro: "Agora somos todos vizinhos." É uma bênção ou uma maldição?

As duas. A Internet foi um tremendo ganho para a liberdade de expressão e de comunicação em todo o mundo e um momento nunca antes verificado na História do Homem. Mas é preciso ponderar que poder comunicar-se através dos smarthphones que estão no bolso de cada um é também um perigo pois convive-se com ameaças de morte, assédio e discursos alucinados. Como escrevo no livro, a Internet é o maior esgoto da história mundial, daí que a questão fundamental que quis analisar seja a de como maximizar a oportunidade e de minimizar os riscos.

 

 

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publicado às 17:48


#2197 - Richard Hawley - I Still Want You (Official Video)

por Carlos Pereira \foleirices, em 05.03.17

 

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publicado às 23:39


#2196 - Women of Ireland

por Carlos Pereira \foleirices, em 05.03.17

 

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publicado às 23:02


#2195 - Livros e Leituras

por Carlos Pereira \foleirices, em 05.03.17

RADUAN NASSAR,MENINA A CAMINHO030.jpg

RADUAN NASSAR

 

HOJE DE MADRUGADA

 

"O que registro agora aconteceu hoje de madrugada quando a porta do meu quarto de trabalho se abriu mansamente, sem que eu notasse. Ergui um instante os olhos da mesa e encontrei os olhos perdidos da minha mulher. Descalça, entrava aqui feito ladrão. Adivinhei logo seu corpo obsceno debaixo da camisola, assim como a tensão escondida na moleza daqueles seus braços, enérgicos em outros tempos. Assim que entrou, ficou espremida ali no canto, me olhando. Ela não dizia nada, eu não dizia nada. Senti num momento que minha mulher mal sustentava a cabeça sob o peso de coisas tão misturadas, ela pensando inclusive que me atrapalhava nessa hora absurda em que raramente trabalho, eu que não trabalhava. Cheguei a pensar que dessa vez ela fosse desabar, mas continuei sem dizer nada, mesmo sabendo que qualquer palavra desprezível poderia quem sabe tranquilizá-la.  (...)"

 

Excerto do conto "Hoje de Madrugada" escrito por Raduan Nassar, que faz parte do livro de contos "Menina a Caminho", edição Companhia das Letras, Fevereiro de 2017

 

 

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publicado às 22:05

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