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a noite feita, ela toda, em segredo
passando da mão direita para a esquerda
e ficar acordado enquanto se adormece
e acordando se se vê que está escrito
de cabeça para baixo
que o mundo de tão lento não se encurva
que tudo está no ovo
e o ovo não aquece nem arrefenta
e que nada está onde é suposto
e o lenço é ar apenas na mão do mágico
e nada se encontra agora onde se encontra
nem a cabeça
nem a caneta
nem a palavra certa para ser escrita
há duzentos ou trezentos anos
quando eu era criança algures noutro alfabeto
e escrevia alto numa espécie de caderno
sem páginas de um lado e de outro
e sem palavra nenhuma
sobretudo
Poema de Herberto Helder in "Letra Aberta", editado em Março de 2016 pela Porto Editora